Tiago
Xavier, em semelhança aos restantes convidados do programa da Linha Lateral da
Rádio Alto Tâmega FM, começou desde cedo ligado ao desporto. Licenciado em
Educação Física na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, o técnico de 44
anos, apesar de ter sido praticante de futebol e futsal percebeu que o seu
talento era treinar. Aos 25 anos começa a sua carreira enquanto treinador, com
passagens pelo futebol, futebol de praia e futsal, por clubes como o Casa
Benfica de Vila Pouca de Aguiar, AEF Johnson Januário, Casa De Cultura De
Vidago, Hóquei Flaviense, GD Chaves e GDC Salto.
Canal
Alto Tâmega- Atacou a temporada com 16 jogadores, um pouco curto, sente que com
mais dois ou três jogadores seria possível garantir a manutenção?
Tiago
Xavier: “Sim, e é preciso ver o contexto de alguns desses
jogadores. Há jogadores que nem sequer começaram a época, depois tenho um
jogador que é, na minha opinião, um jogador de segunda divisão, o “Gato” que
está em Santarém e veio a dois, três jogos. Numa altura de mais jogos
faltou-nos mais gente, porque com estes 16, tínhamos que ir rezando e ir
gerindo para que não houvesse lesões, agora sabemos que isso é impossível ou
que é muito difícil, até porque a intensidade é muito diferente. Nós estávamos
habituados ao ritmo da distrital e passamos para um nível de terceira divisão e
mantivemos as duas unidades de treino. Éramos a única equipa da série que treinava
apenas duas vezes, não havia condições para treinar três, porque nós treinamos
em Montalegre e não temos nenhum jogador, nem nenhum dirigente de Montalegre.
Canal
Alto Tâmega - Sente dificuldade da interioridade na hora de formar plantel?
Tiago
Xavier: “É difícil contratar aqui, na zona do Porto é muito
fácil contratar. Em primeiro lugar encontrar jogadores com características de
terceira divisão e depois é preciso pagar o dobro do que o jogador recebe em
equipas da zona de Guimarães ou Porto. O concelho de Montalegre tinha três
equipas nos nacionais seniores, Montalegre no Futebol de 11, Vilar de Perdizes
no Futebol de 11 e o Salto no futsal e o destino foi o mesmo, as três desceram
de divisão, não me acredito que seja por culpa dos treinadores, os três
treinadores não eram fracos, não era por culpa dos jogadores. Agora é preciso
pensar porquê, há jogadores que eu falei no início da época para virem para o
Salto, que só em transporte, era mais caro do que aquilo que o Salto podia
pagar só para jogar. A maior cidade o Alto Tâmega é Chaves, e Chaves não tem
futsal, (…) os jogadores de futsal que existem hoje são os que haviam há 10
anos, depois Salto fica numa zona perto de Braga, perto de Chaves, temos muitos
jogadores de Cabeceiras de Basto, o problema é que depois tens que ir para
Montalegre, de Salto a Montalegre são 30, 40 minutos. Não é que não tenham
qualidade (jogadores da região), não têm mentalidade, não têm o espírito de
sacrifício. Há jogadores que são claramente de distrital, quando sobem o
patamar, têm muita dificuldade, mas é o espírito, a mentalidade, não são muito
competitivos.”
Canal
Alto Tâmega - Existe muita diferença de condições, ao nível de treino, espaço e
um pouco, em geral entre o GDC Salto e o resto das equipas da terceira divisão?
Tiago
Xavier: “O Salto não tem condições nenhumas, eu posso dizer,
que treino o Salto há um ano e meio e fui a Salto 5 vezes. Salto não tem
pavilhão, irá ter segundo sei, mas não tem. Nós treinamos em Boticas, em
Montalegre, em Vila Pouca de Aguiar, em Pedras Salgadas. Tivemos que arranjar
jogos-treino em Cerva e Vila Real. O grande problema do Salto é não ter casa
própria e é ter que andar a pedir por favor para treinar. Nós defrontamos
algumas equipas profissionais, que estruturalmente são profissionais e quer se
queira, quer não, a equipa mais profissional foi a AD Jorge Antunes, que ficou
em primeiro e subiu, a segunda claramente o Boavista, ficou em segundo e subiu,
a terceira equipa mais profissional que vi foi o Valpaços, que ficou em
terceiro. As equipas menos profissionais, excetuando o Maia, que tinha algumas
condições, desceram de divisão. Depois há equipas medianas, que têm pavilhão,
por exemplo, o CA Mogadouro têm pavilhão na Régua e treinam quando querem,
ficaram ali no meio da tabela, isso faz muita importância. Nesta época quando
se falou da minha continuidade ou não, exigi algumas coisas que eu acho que o
Salto não pode oferecer, que são condições para os jogadores. Nós temos que ter
uma casa, a casa do Salto tem que ser, seja Boticas, seja Montalegre, seja Ribeira
de Pena. Nós temos que ser os mais profissionais dentro do amadorismo, porque
se nós vamos ser mais uns amadores, iremos ficar a meio da tabela. Nós em tudo
o que fazemos, temos que ser profissionais, aquela hora e meia de treino, somos
profissionais.”
Canal
Alto Tâmega - Como é que foi a adaptação ao contexto de terceira divisão?
Tiago
Xavier: “Custou um bocadinho, é evidente que o primeiro
impacto é a motivação. Nos primeiros jogos muito motivados, bons resultados,
até que aquela motivação baixa um bocadinho e aí tem que entrar outras coisas,
tem que entrar qualidade, tem que entrar organização e entra a parte física.
Nós treinávamos por semana duas vezes, havia clubes que treinavam três ou
quatro. Numa semana a diferença é uma ou duas unidades de treino, no final do
mês estamos a falar de oito, no final do ano são muitas unidades de treino de
diferença. Se tirássemos os últimos 10 minutos de cada jogo, o Salto ficava
tranquilamente a meio da tabela. O jogo dura 40 minutos e os rapazes tiveram
muita vontade, muito espírito de sacrifício, mas não há milagres. Nós fomos
sempre uma equipa super organizada, perdemos muitos jogos por um. Depois existe
a experiência, jogamos contra jogadores com 10 ou 15 anos de nacional e os meus
meninos tinham, alguns deles, zero. Em jogos equilibrados, no final dos jogos,
a experiência conta muito e depois também notamos que tivemos excelentes
arbitragens em casa, em jogos fora e complicados, não ajudaram.
Canal
Alto Tâmega- Já referiu que o seu futuro não passa pelo GDC Salto, o que
podemos esperar do seu futuro profissional?
Tiago
Xavier: “Não faço ideia, curioso que a única abordagem, mais
séria, que tive para esta época foi para o futebol de 11, mas sinceramente não
sei, não sei, porque as pessoas querem respostas muito rápidas, mesmo o Salto
queria respostas rápidas. Eu casei há um mês, estive 15 dias fora do país e não
ia estar com cabeça para decidir. A mim o desporto faz-me falta porque gosto,
não em termos financeiros, porque trabalho muito durante o dia, para dar
qualidade de vida aos meus filhos, à minha mulher, para ter a minha qualidade
de vida e à noite é um extra. Eu não vou mendigar a clube nenhum, toda a gente
tem o meu número de telefone, quem quiser contar com o Tiago pode ligar e eu
falo com toda a gente, senão vou ficar tranquilo em casa a ver jogos. Já não estou
naquela idade, que treino em qualquer sítio, com quaisquer condições, só porque
sim, não o irei fazer, jamais irei treinar só para não estar em casa.”
Canal
Alto Tâmega - Tem uma subida histórica com o Desportivo de Chaves à Divisão de
Elite e um honroso quarto lugar na estreia nesse campeonato, que recordações
guarda desses anos?
Tiago
Xavier: “Primeiro lugar, tenho dois anos antes desses, que
não conseguimos a subida, uma delas custou muito, porque estava muito próxima.
A estrutura era muito complicada, nos tínhamos uma grande equipa só com
jogadores locais, no primeiro ano era tudo jogador daqui, penso que não tinha
ninguém de fora, mas havia sempre um problema, nós fazíamos uma fase regular
fantástica e depois chegava a setembro, na altura das decisões e os meus
jogadores iam para o futebol de 11, os clubes proibiam os jogadores jogarem
futebol de praia, então íamos superlimitados à Nazaré. Uma vez fomos disputar a
subida com o Salgueiros e éramos sete jogadores, custava muito essa parte de
chegar à altura decisiva e não contar com os melhores. No ano da subida
apostamos pela mistura, trazer gente de fora, gente profissional, que nos
assegurava, a presença na fase decisiva. Já tenho graças a deus, momentos muito
bons, alguns títulos, algumas subidas, mas a subida do Chaves Futebol de Praia foi
o dia mais feliz da minha vida em termos desportivos, não só por mim, mas
também pelas pessoas que lá trabalhavam, pelo Luís Carlos, aquilo era a vida
dele e ver aquela felicidade nele e naquelas pessoas que o rodeavam. No ano
seguinte, foi o ano de mais exigência e se o quarto lugar no início do ano era
impensável, nós chegamos ao fim com o sentimento que podia ter sido feito algo
mais. Nós aí sentimos muita interioridade, classificámo-nos para o apuramento
de campeão, jogamos com o Benfica, Braga e Sporting. Logo no primeiro jogo com
o Benfica, fomos ganhar 1-0 quase no fim, aí sim, sentimos a interioridade,
sentimos que estávamos lá a mais e que nunca conseguiríamos ser campeões nacionais.
Com o Sporting batemo-nos de igual para igual, com o Braga, já fora de luta,
foi diferente. Tenho quase a certeza que essa equipa, no ano passado e este ano
era campeã nacional de Futebol de Praia.”
Texto:
Diogo Batista
Foto:
Márcio Pires