Igreja da Misericórdia de Chaves recebeu peça de Adaptação do “Sermão de Santo António aos Peixes”

Mais de uma centena de alunos, de seis turmas do 11º ano a frequentar a Escola Secundária Dr. Júlio Martins foram desafiados a assistir a uma recriação do “Sermão de Santo António aos Peixes”, do Padre António Vieira. Durante uma hora e meia os jovens recuaram até ao século XVII.

 A tarefa não era fácil, mas para o professor Henrique Fonseca foi amplamente superada. De acordo com o professor de Português e coordenador do Departamento daquela disciplina, no Agrupamento de Escolas Dr. Júlio Martins, a experiência permite enriquecer o processo de aprendizagem dos alunos, cuja obra literária faz parte do conteúdo letivo da disciplina de Português que tem como tema principal a crítica social

“Uma coisa é a aprendizagem na sala de aula, outra coisa é neste contexto, neste espaço maravilhoso vivenciarem o que é uma representação e ouvirem a pronúncia do Sermão”, referiu o docente.

Promover a visão crítica dos jovens perante a sociedade

Os alunos puderam comprovar “a força da palavra, assim como a sua eficácia persuasiva” nos sermões de Vieira como “grande operador da língua portuguesa que se notabilizou pela sua capacidade retórica”, através da “maestria” com que foi protagonizada que “nos deixa quase sem palavras, emocionados”, aludiu.

A obra “não é lecionada do ponto de vista religioso, catequizador, mas como uma obra literária importantíssima para eles perceberem as metáforas, alegorias, os conceitos que são transmitidos através do Sermão”.

Fazem parte dos objetivos da atividade “incutir neles o debate e proporcionar-lhes uma reflexão sobre os conteúdos e depois uma consolidação daquilo que tem sido lecionado”.

Um texto marcado pela sátira e o humor

O “Sermão de Santo António aos Peixes” constitui uma alegoria da alma humana, dos seus vícios e virtudes, sobretudo quando em causa está a sua ambição de poder. O texto tece críticas ferozes aos humanos e o Padre António Vieira recorre à metáfora dos peixes para denunciar, com imaginação e sátira a exploração do homem pelo homem.

O ator Marcelo Lafontana tornou viva a mensagem de Vieira. O desafio de captar a atenção de um público jovem “moldado às novas tecnologias” faz parte de um processo que passa por “muita interação com os alunos”.

Para o ator que há 15 anos leva à cena a obra de Vieira “estes jovens cresceram moldados a um tempo de comunicação muito curto, a um tempo de concentração muito restrito e vir abordar uma coisa que toda ela é oralidade é necessário estar sempre a mudar de estímulos, transformar perguntas retóricas em perguntas diretas”.

Linguagem barroca

A oratória implícita na obra considerada barroca “complementou-se brilhantemente” segundo Marcelo, num espaço também ele totalmente barroco em arquitetura, azulejaria, pintura e talha como é a Igreja da Misericórdia de Chaves.

“O espaço é perfeito. A iconografia presente ajuda-nos tremendamente e enriquece o Sermão. As curvas e a sensualidade do barroco que é a arte da decoração excessiva, mas não gongórica, um excesso bonito, apreciado que combina com os jogos de palavras que só encontra par numa talha dourada como a desta igreja maravilhosa”, declarou, no final da peça.  

Tal como os sermões de Vieira, disse Marcelo “a arte é um exercício de provocação, de inconformismo, apelo à mudança. Como fala para as emoções, a arte tem essa capacidade”.

A encenação da adaptação da obra de Vieira tem a mão de Marcelo e está em digressão em diversas cidades do centro e norte do país, desde o passado mês de setembro prolongando-se até março do próximo ano.

Para além de ator/pregador e encenador da peça, Marcelo é o responsável pela Companhia de Teatro “Lafontana – Formas Animadas” sedeada em Vila do Conde, que conta com 25 anos de existência.

Sandra Gonçalves