A
antiga escola primária de Faiões foi construída, totalmente a granito, no
século XX, com projeto de Baltazar de Castro e Rogério de Azevedo, dois
ilustres arquitetos.
Foi obra do
esforço conjunto da população da freguesia e do benemérito, Dr. António Luís
Morais Sarmento, habitante de Faiões e antigo reitor da Universidade de
Coimbra. A escola foi concebida para três
salas de aula, uma para o sexo feminino e duas para o sexo masculino e cantina,
contemplando ainda sala de reuniões agrícolas, o recreio e outros
compartimentos, como as instalações sanitárias.
Este edifício celebra hoje 90 anos de existência e a comunidade
online do Facebook ‘Faiões no Coração’ decidiu assinalar o dia com um texto da
autoria do historiador local, Mário Coelho, acompanhado de algumas imagens de
vários momentos ao longo destes 90 anos captadas na escola.
Foto: Carlos Daniel
Morais
TEXTO MÁRIO COELHO
Escola Primária de Faiões
A escola primária de Faiões foi inaugurada exatamente
à 90 anos.
Foi no dia 22 de outubro de 1934 que pela primeira vez
se fizeram ouvir as correrias dos petizes, no pátio da nossa antiga escola.
Provavelmente também se ouviram gritos eufóricos e estridentes, como só as
crianças conseguem projetar, e um ou outro choro, resultando de alguma queda ou
brincadeira mais agressiva.
Nesse dia compareceram, também, algumas das mais
eminentes figuras políticas e religiosas do panorama Regional e Nacional. A
título de exemplo podemos referir o Presidente da República, o Ministro do
Conselho e o Bispo da Diocese.
Havia fortes razões para esse empenho das autoridades
do Estado Novo, que contava apenas um ano e que aqui, em Faiões, optou por um
edifício de grande monumentalidade, evocando grandezas que o nosso benemérito e
ilustre filho, Dr. Morais Sarmento, professor de Medicina em Coimbra, adotou.
A originalidade deste belíssimo edifício é abastadas
vezes referida como resultando de uma inspiração no vetusto Paço das Escolas,
em Coimbra. A inovação deste edifício quando cotejado com a maioria das escolas
primárias dispersas por todo o país, deve-se, quanto a nós, ao facto de o
próprio regime estar numa fase de experimentação e preparação do lançamento
daquele que viria a ficar conhecido como Plano dos Centenários, um projeto que
originou a construção em massa, de escolas primárias, de tipologia pré-definida,
com ligeiras adaptações ao clima local.
Estranhamos, contudo, a relativa pouca importância que
tem sido dedicada a esta singular construção pelo mundo académico, nomeadamente
nos campos da Arte e da Arquitetura, principalmente se lembrarmos que este
edifício foi desenhado por Baltazar de Castro e Rogério de Azevedo, dois
ilustres arquitetos, homens envolvidos nas mais modernas correntes estéticas da
arquitetura portuguesa coeva, bem como, na adaptação de características
intrínsecas do modo de construir português aos diferentes climas e aspetos regionais
do nosso país.
A
escola, composta por três salas, foi construída em bom granito transmontano e dispunha
de cantina social e um espaço bem amplo e aprazível para o recreio dos alunos,
coberto por alpendre e lajeado. Possui vedação, entrada de aparato com
escadaria dupla e fontanário público na estrada de Chaves a Bragança.
As
gentes de Faiões, ávidas de um lugar onde seus filhos pudessem receber uma
educação adequada às necessidades do tempo, deitaram mãos à obra e com o
trabalho e participação de todos, conseguiram construir um edifício escolar preparado para ensino misto, cabendo-lhes
acarretar toda a pedra de granito, em carros de bois, desde a vizinha aldeia do
Castelo de Eiras.
Após o
25 de abril de 1974, com o encerramento da Cantina, aproveitou-se a libertação
dos antigos cómodos para a lenha, para aí instalar a Sede, Bar e Sala de
Troféus da nossa agremiação desportiva (Centro Desportivo e Cultural de
Faiões). Também se procedeu à maior alteração ainda hoje visível neste projeto,
a construção de um polidesportivo, ampliando, deste modo, o acesso dos atletas
e alunos, às diferentes práticas desportivas.
Em
1987, aproveitando o facto de não estar a laborar a cantina e atendendo ao
número limitado de salas, foi instalado o Jardim de Infância na antiga sala de
refeições.
A
excecionalidade deste edifício, aliada ao carácter imaterial que cada faioense
carrega, destacando a forma gregária como se procedeu à sua construção ou tão
simplesmente a existência de uma cantina social, suscitaram já, por diversas
ocasiões, o interesse de alguns meios de comunicação de alcance nacional, como
por exemplo a RTP ou o Porto Canal, levando também a Câmara Municipal de Chaves
a iniciar o processo de classificação desta antiga Escola, para a categoria de
Imóvel de Interesse Municipal.
Hoje,
volvidos mais de dez anos do seu encerramento, concluímos que foi um golpe
profundo na vivencia da comunidade. Era muitas vezes na escola que laços de
amizade se formavam e perduravam, construindo uma identidade coletiva cada vez
mais sólida.
Mas
parece-nos que pode continuar a ser lugar de mostra, de palestra e de reunião
de todos os faioenses, os residentes e os da diáspora. Assim o queiram as suas
gentes, que no passado mostraram não haver obstáculo suficientemente grande
para os deter.
Com o
encerramento da Escola, quando hoje a visitamos somos invadidos por um grande
sentimento de orfandade. Faltam as vozes, as correrias, os gritos, mas também
os sorrisos das professoras e da funcionária. É como se estes muros de pedra
fria ficassem ainda mais gelados, como nos versos de Miguel Torga:
Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?
Como as estátuas, que são gente
nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
Que não tem coração dentro do
peito….